sexta-feira, 25 de maio de 2007

Rotina

Mude, mas comece devagar, porque a direcção é mais importante que a velocidade.
Sente-se numa outra cadeira, do outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde passa.
Apanhe outros autocarros.
Mude por uns tempos o seu estilo de vestir.
Dê os seus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.
Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda.
Durma no outro lado da cama... depois, procure dormir em outras camas.
Assista a outros programas de TV, compre outros jornais... leia outros livros, viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas sabores.
Tente o novo todo dia.
O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor, a nova vida.
Tente.
Procure novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.
Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, beba uma outra bebida, compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado... outra marca de sabonete, outra pasta de dentes...
Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores.
Vá passear noutros lugares.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias.
Jogue fora os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta noutro banco.
Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus.
Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só.
Pense seriamente em arranjar outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais suave, mais prazeroso, mais digno, mais humano.
Se não encontrar razões para ser livre, invente-as.
Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino.
Experimente coisas novas.
Troque novamente.
Mude, de novo.
Experimente outra vez.
Certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia.
Só o que está morto não muda!
Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não vale a pena!

segunda-feira, 7 de maio de 2007

Adolfo Luxúria Canibal-Biografia

Adolfo Luxúria Canibal nasceu em Luanda, Angola. Cresceu entre Vieira do Minho e Braga e em 1978 migrou para Lisboa, cursar Direito. Viveu em Lisboa até 1999, onde exerceu a advocacia e a consultoria jurídica. Mudou-se depois para Paris onde praticou diversos misteres, como tradutor, actor de figuração, gerente comercial, jornalista, cronista, voz para telemóveis, estudos de mercado, crítico musical ou gestor liquidatário de sociedades cinematográficas.

No final de 2004 regressou a Braga e à consultoria jurídica.

Fundador, letrista e vocalista do grupo Mão Morta, desde 1984, depois de ter fundado e exercido igual função nos grupos Bang-Bang (1981), Auaufeiomau (1981-1984) e PVT Industrial (1984).

Desde 2000 passou a integrar o grupo francês Mécanosphère, como vocalista. Participou como actor nos filmes "Gel Fatal" (1996), de António Ferreira, e "O Dragão de Fumo" (1998), de José Carlos de Oliveira. Autor de espectáculos de spoken word, a solo (1999) ou com António Rafael (desde 2004). Editou os livros "Rock & Roll" e "Estilhaços" e escreveu o prefácio para uma edição de "Os Cantos de Maldoror", do Conde de Lautrèamont. Traduziu Heiner Müller (1997) e Vladimir Maiakovski (2006). Encenou e participou como actor em performances e espectáculos multimédia como "Rococó, Faz o Galo" (1983), "Dos Gatos Brancos que Jazem Mortos na Berma do Caminho de Ferro" (1983), "Labiu e a Pulga Amestrada" (1984) e "Müller no Hotel Hessischer Hof" (1997). Participou como vocalista ou letrista em diversos discos e espectáculos de mais de uma dezena de grupos e artistas portugueses e estrangeiros, como Pop Dell'Arte, Clã, Moonspell, WrayGunn, Houdini Blues, Pat Kay & The Gajos ou Steve McKay. Participou como letrista num grupo recente conhecido como "Mundo Cão"

Foi considerado, em 2003, pelo semanário "Expresso", como uma das cinquenta personalidades vivas mais importantes da cultura portuguesa.

UMA MÃE ESPECIAL

Aprendi a conhecer uma mãe
uma mulher sem limites de amar
uma filha-mãe incansável tal
que já nem sabe se é filha ou mãe!

Uma mãe-irmã sempre atenta
negando o cansaço lategante
a fazer da vida um ato de amor
e do servir um acto constante

Uma mãe-mãe compreensiva
a carregar o fardo sem reclamar
e se por vezes se faz intempestiva
é tão somente por pelo zêlo de amar

Uma mãe-avó sempre presente
ainda que a dor precise esconder
que oculta as lágrimas, silente
quando mais não pode fazer

E se o cansaço atinge o limite
respira fundo e segue adiante
no incansável afã persiste
qual anjo-mulher a cada instante.

Esse ser adentrou minha vida
todo cheio de zêlo e cuidados
se tornou minha prenda querida
me fazendo assim abençoado.

Nestas mal traçadas linhas
numa mistura de letras e versos
agradeço a sua presença viva
a Deus, senhor do universo

ALEGRIA DE VIVER


Alegria de viver, que coisa mais linda,algo que nos faz bem,nos dá uma felicidade infinda...faz bem à alma e ao corpo também.

A vida sempre é bela,para quem vive feliz,a vida sempre é bela,está bem quem o diz.
A alegria de viver está na alma,é uma sensação de felicidade,que sempre nos acalma,e nos dá tranqüilidade.
Sabiamente já se dizia que a felicidade pode ser sempre encontrada,não tem credo, cor, nem idade,e tam pouco deve ser procurada.
A felicidade está na nossa frente,só depende, essa é a verdade,de que realmente, minha gente,seja essa a nossa vontade.
A felicidade está no amor,está na paz, está na amizade,devemos sempre ter n'alma o calordo amor, e assim, a felicidade.
A felicidade encontramos,ao sentirmos toda essa ternura,quando juntos estamos,vivendo esta aventura...

sábado, 5 de maio de 2007

A Maçã de Eva


adaoeeva
Se há por aí história mal contada é aquela de Adão e Eva no paraíso. Senão vejamos: Deus cria o Homem (entre outras coisas) e manda-o para o paraíso. Isto já de si é suspeito. Porque não o mandou para outro sítio qualquer? Porque não o mandou à merda? Nunca saberemos, mas o que é certo é que o Homem lá foi diligentemente para aquilo que Deus convencionou por paraíso. Na realidade era um pardieiro vazio, sem interesse nenhum e completamente despovoado. Não fossem umas arvorezinhas aqui e ali e assemelhar-se-ia ao Alentejo profundo. Diz a história que Adão, farto de contar as árvores, que nem eram tantas como isso, meteu um requerimento a Deus para lhe arranjar companhia. Distraidamente Deus mandou-lhe uma ovelha e rapidamente descobriu o significado da contranatura. Decidiu então fazer um truque com uma costela de Adão, criando dali uma companheira para o entediado mamífero. Chamou-lhe de Eva.
Ainda hoje a ciência tenta perceber que conhecimentos de genética o gajo tinha para fazer um truque daqueles.
A questão das roupas é insidiosa… se os gajos estão no paraíso porque diabo têm que usar parras a tapar-lhes a genitália? Armani e Prada seriam mais plausíveis, bolas! Afinal de contas que paraíso era aquele??
Depois vem outra parte incongruente: aquela em que Deus, num lampejo de autoridade tipo «quem manda aqui sou eu e vou inventar uma merda para vos deixar a matutar» decide embirrar com as maçãs e proibir Adão e Eva de as comer. Qual é o problema das laranjas? E das papaias? Porque não proibir as bananas? Ou toda a gama de frutos secos? É só incongruências…
Chegamos então à parte da cobra que falava. Tudo bem. Eu até ter ouvido as declarações de Fátima Felgueiras, achava que as cobras não falavam, portanto isto até faz algum sentido no meio desta trapalhada toda. Mas a questão é que a cobra de Adão e Eva demonstra uma obsessão voyeurística qualquer por maçãs. Gosta de as ver serem comidas. Há gostos para tudo…
Finalmente os gajos comem a maçã e Deus aparece para os expulsar do paraíso e não se fala mais nisso. Porquê? A história acaba aqui porquê? E a vida porca que eles levaram depois, com a obsessão insidiosa que Adão desenvolveu por ovelhas? Nem Sócrates contava tão mal uma história destas…


desabafo da Maquina

Uma percepção invade-me sempre a minha mente, aparentemente eterna sorvedoura de material de pensamento, sempre intrigada com possibilidades e receios, oportunidades e loucuras. Como separar o trigo do joio? Será a visão do todo separada da minha visão pessoal irremediavelmente? Deverei evitar qualquer discernimento sobre o mundo? Concentrar-me sobre o "inner-self", este mundo tão "belo", numa orgia masturbatória que se escape às diatribes conspiracionistas de outro modo inevitáveis?

Pergunto-me. Será o mundo intocável, impenetrável, diferentes cubos para diferentes pessoas, a cada um a sua lógica pessoal? A cada um a sua liberdade? E para quê esta liberdade toda? Qual a sua função? O que nos permite ela fazer? Foder a vizinha sem preocupações posteriores?!?
E se a cada um a sua vida, restar-nos-á apenas as nossas memórias da infância inexistente como literatura possível? A máxima tolerância pelo outro acoplada à mínima atenção, reconhecimento da verdade do outro?

Existirá a verdade? Como separar a teoria mais realista e confiável da pura especulação conspiracionista? Pensem um pouco nisto. Sempre se vê a lição do Pedro e do Lobo como uma questão moral que se impôe ao Pedro, mas ninguém se pergunta sobre a lição que a sua aldeia não retirou: como discernir entre a partida e o relato desesperado?

Será a visão de Einstein e de Darwin assim tão "verdadeira" como isso, o que as separa da ficção?!?

Vejamos a sociedade por este prisma. Pedros não nos faltam, acossando-nos constantemente sobre os perigos iminentes, escândalos políticos ou judiciais, fraudes gigantescas, big brothers mundiais que nos controlam e escravizam, um planeta inteiro engrenado na auto-destruição.

Como não poderia a enorme aldeia das massas se alienar com tanto barulho? Tanta idiotice à volta de um "problema grave de saúde pública" como o aborto, quando morrem por dia tantas mulheres em acidentes de automóvel como por ano por causa do aborto?
Problema de saúde pública? Tão problema como a Gripe das Aves, que é A doença menos mortífera do mundo alguma vez conhecida (e vejam a mediatização...)

Tanta idiotice à volta do caso Camarate, Casa-Pia, Apito-Dourado, raptos ou adopções de sargentos bem intencionados?!?

Tudo isto enquanto há guerra? (e onde o referendo sobre a nossa participação na invasão?) Tudo isto enquanto há milhões de pessoas a morrer por falta de condições? (Lá vem ele!) É verdade, porra. E o que fazemos nós? Que mundo desejamos, desejamos, construir? Palavra chave: desejamos... Desejamos ainda seja o que fôr?

(Who cares?)

Como não poderia a enorme aldeia das massas gostar tanto de futebol, de vinho, de sexo e noites para esquecer?

sexta-feira, 4 de maio de 2007

A Morte Absoluta....

Morrer.
Morrer de corpo e alma.
Completamente.

Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão — felizes! — num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.

Morrer sem deixar porventura uma alma errante…
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?

Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança duma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento.
Em nenhuma epiderme.

Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: “Quem foi?...”

Morrer mais completamente ainda,
— Sem deixar sequer esse nome.


Manuel Bandeira, Lira dos Cinquent’anos (1940)

O Poema...

Gadamer:
“O poema é dominado por um forte contraste. A neve, que torna tudo uniforme e frio mas que igualmente acalma, não é somente recebida aqui, ela também é saudada. Pois o verão, que permanece atrás daquele que fala, pelo visto foi dificilmente suportado na profusão de sua atividade, de seu desabrochar e desdobrar-se. Certamente não se trata de um verão real, tampouco o Tu que é interpelado significa o inverno ou oferece neve real. Certamente houve um tempo de profusão, contra o qual a esterilidade do inverno atua como um alívio. (…) Além do mais, deve-se atentar para o que significa o ’sempre’. A ênfase em um caminho repetido sugere que a esperança do caminhante, daquele que continua sempre a andar, nunca é realizada. Essa esperança seria a de ser acompanhado pela amoreira da vida ainda que uma única vez, calma e silenciosamente. Porém, haverá sempre um novo rebento, exigente como o grito do recém-nascido sedento, não permitindo qualquer tranquilidade. (…) Quem poderá definir o que está em jogo entre desejo e renúncia, entre verão e inverno, vida e morte, grito e tranquilidade, palavra e silêncio? O que estes versos expressam é a disposição para aceitar esse outro, seja ele o que for. Assim, parece-me, por fim, inteiramente possível ler essa disposição diretamente como disposição para a morte, como aceitação do último e mais extremo contraste com o excesso da vida. (…) Perguntamos novamente: o que significa ‘neve’ aqui? Seria uma alusão à experiência de fazer poesia? Seria talvez a palavra do próprio poema que se enuncia à medida que, em sua discrição, garante o silêncio do inverno, oferecido como uma dádiva? Ou será que ela significa, e é, para todos nós, aquele ser silencioso depois de um excesso de palavras, que todos conhecemos e que pode aparecer para todos nós como um alívio verdadeiro? A questão não é para ser respondida. A distinção entre mim e você, entre o Eu do poeta e todos nós, a quem seu poema alcança, falha. O poema diz ao poeta, assim como a todos nós, que o silêncio é bem-vindo. (…).”

Além da abordagem de temas que me interessam, a interpretação de Gadamer me atrai justamente porque abre mais um espaço para o silêncio ao dizer que algumas questões importantes não precisam ser respondidas, o que, por si só, já reduz a opressão da ‘normalidade’ cotidiana de palavras, frases, respostas, certezas.

A noite desce...

Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos cansados, carinhosas,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!

A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite voi descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minhalma
Beijando nesta hora a minha boca!