sábado, 3 de março de 2007

Profundo e silencioso

Tu disseste: "Quero saborear o infinito"

Eu disse: "A frescura das macas matinais
revela-nos segredos insondaveis"

Tu disseste: "Sentir a aragem que balanca os dependurados"

Eu disse: "É o medo que nos vem acariciar"

Tu disseste: "Eu também ja tive medo. muito medo;
recusava-me a abrir a janela, a transpor o limiar da porta"

Eu disse: "Acabamos a gostar do medo,
do arrepio que nos suspende a fala"

Tu disseste: "Um dia fiquei sem nada.
Um mundo inteiro por descobrir"

Eu disse: "O que é que isso interesse?"

Tu disseste: "Nada..."

Tu disseste: "Agora procuro o designio da vida;
às vezes penso encontra-lo num bater de asas,
num murmurio trazido pelo vento, no piscar de um néon;
escrevo paginas e paginas a tentar formaliza-lo.
Depois queimo tudo e prossigo a minha busca.

Eu disse: "Eu nao faco nada.
Fico horas a olhar para uma mancha na parede"

Tu disseste: "E nunca sentiste a mancha a alastrar,
as suas formas num palpitar quase imperceptivel?"

Eu disse: "Nao. A mancha continua no mesmo sitio,
eu continuo a olhar para ela e nao se passa nada"

Tu disseste: "E no entanto a mancha alastra
e toma conta de ti, liberta-te do corpo. Tu é que nao ves"

Eu disse: "O que é que isso interessa?"

Tu disseste: "Nada..."

Sem comentários: